sexta-feira, 12 de julho de 2013

Bolha Imobiliária I: Indícios de Mercado

Este é um tópico polêmico e a mídia econômica dificilmente aborda o assunto. Relatórios normalmente são viesados pois são contratados e divulgados por imobiliárias, SECOVIs e construtoras. Só temos uma solução então, vamos olhar os dados!
            Aí esbarramos no segundo problema. No Brasil temos uma carência muito grande de dados do Mercado Imobiliário. Não existem estatísticas confiáveis do número e valor dos negócios realizados. Dados sobre alavancagem via crédito são limitados pois o Brasil é o único país que tem a cultura de empreendimentos parcialmente financiados por consumidores e investidores “na planta”. Isto sem contar o financiamento informal, entre parentes e relativos (comum em países com juros nominal elevado). Enfim, tentar analisar o Mercado Imobiliário brasileiro é um grande desafio. A falta de dados confiáveis é perfeita para que se possa auferir basicamente qualquer conclusão que se queira, basta escolher os dados certos a serem analisados.
            Pois bem, esta análise vai procurar se ater a dados que são irrefutáveis. Em economia existe uma fonte de informação que resume basicamente todas as informações disponíveis no mercado em uma única linguagem: PREÇOS.

                Fato: Preços de Imóveis no Brasil nos principais centros urbanos estão altos.

                Pergunta: Existe uma Bolha Imobiliária no Brasil?

              Vamos perguntar ao Mercado, e ele nos responderá o que acha na linguagem de preços. Abaixo vemos um gráfico comparativo da evolução de preços do índice FIPE-ZAP de Rio de Janeiro e São Paulo e comparamos com um índice de valorização das ações de quatro grandes empresas do setor imobiliário: PDG, Gafisa, Cyrela e Brookfield. Pela limitação que temos de dados do FIPE-ZAP, o historico se inicia em 2008.

Fonte: FIPE e Bloomberg
                
                 Ao analisarmos os dados acima, observamos claramente que há uma incoerência neste Mercado a partir de 2011. Empresas que observam uma alta vertiginosa e constante de seu principal produto de venda, deveriam experimentar valorização semelhante. Observamos que, de fato, as ações das empresas em questão experimentaram valorização após o estouro da Bolha Imobiliária Americana (out-2008), acompanhando o movimento de alta do índice FIPE-ZAP até meados de jan-11.
                O espantoso neste gráfico é observar os dados a partir de 2011! Observe que as ações de empresas do setor imobiliário experimentam desde então quedas acentuadas! No hemisfério norte do gráfico o índice FIPE-ZAP acelera alta e sobe como se pertencesse a outro mundo. A distorção é tão grande que parece que estamos comparando setores distintos e negativamente correlacionados!
                Contra fatos, não há argumentos: de jan-08 a jun-13 observamos as seguintes variações:
                
             Como é possível que empresas que tem uma valoração do preço de seus produtos de 300% em 5 anos, experimentem quedas tão drasticas em seu valor? Já sei, o preço do produto nos dá apenas uma noção na melhora das receitas, mas não aponta para o crescimento dos custos! Era de se esperar então que para tamanha queda nas cotações o custo de construção civil tivesse aumentado muito acima do FIPE-ZAP.
          Pasmem, Segundo dados do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil – SINAPI do IBGE, os custos de jan-08 a jun-13 subiram 146,9%. Portanto, o mercado está vendo alguma coisa que os anunciantes do FIPE-ZAP não estão vendo.
Fonte: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/precos/sinapi/defaultindice.shtm
                Alguém pode argumentar que fui tendencioso. Apesar das empresas selecionadas serem empresas de grande porte do setor, alguém pode argumentar de que eu posso ter selecionado apenas as empresas com desempenho ruim. Vamos então olhar dois indices agregados do setor: O IMOB – índice que reúne as empresas do setor imobiliário listadas na Bovespa e o IFIX – índice dos fundos imobiliários negociados em bolsa.
               O IFIX foi lançado em dez-10, portanto vamos avaliar com este índice justamente o periodo em que começou o descolamento dos preços anunciados no FIPE-ZAP para o valuation de Mercado para ativos do setor imobiliário.
Fonte: FIPE e Bloomberg
                
   Como podemos observar no gráfico acima, tanto o índice IMOB quanto o IFIX descolaram do índice FIPE-ZAP. Importante observarmos que fundos imobiliários, ao contrário de ações, não são como as empresas do IMOB. Os fundos imobiliários são na verdade cotas de imóveis!!! Ou seja, a queda acentuada do índice IFIX representa uma queda real no valor dos imóveis de Fev-13 até o momento!    De jan-13 até agora o IMOB já caiu 24,1% enquanto o IFIX caiu 12,4%!
                A conclusão a partir dos fatos é de que não é o Blog Deseconomia Brasileira que diz haver uma Bolha Imobiliária, não é nenhum “consultor imobiliário” que diz isso. E não espere que eles o digam. Nos Estados Unidos a Bolha foi negada por autoridades, bancos e mídia até o momento em que efetivamente estourou. Um dado interessante e o ultimo a ser postado é o gráfico do índice S&P Real Estate. Este é um índice similar ao IMOB, mas para o Mercado Americano.
Fonte: Bloomberg
                
    O gráfico acima mostra que o Mercado de ações por ser muito mais liquido que o Mercado de imóveis reage antecipadamente. No caso Americano as ações do setor caíram 30% de seu topo historico em um horizonte de aproximadamente 20 meses até que efetivamente os agentes percebessem que a Bolha Imobiliária havia estourado, levando a fase de desespero e quedas ainda mais acentuadas no Mercado Imobiliário.
            A conclusão portanto, é que a leitura dos preços de Mercado no Brasil apontam fortes indícios de estarmos na fase final do estouro de uma Bolha Imobiliária. As distorções econômicas abordadas em posts anteriores demonstram o ambiente perfeito para a proliferação de uma Bolha. O cenário projetado daqui pra frente é propício para seu estouro: alta inflação, elevação dos juros/redução de liquidez e aumento de desemprego. Já temos motivos suficientes para nos preocupar com a economia agora, olhando o “time frame” de estouro da Bolha Imobiliária Americana… Imagina depois da Copa?

12 comentários:

  1. Uma dúvida: Por que a EzTec tem lucros crescentes ano pós ano se o mercado está travado, se vivemos uma bolha e os descontos são enormes?

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Empresa menos alavancada, mais enxuta, e que vende ativos a preços mais justos. O que difere das outras.

      Excluir
  2. Prezado Marcio,

    Sua observação é bem relevante. Um primeiro fator que conta bastante a favor da EzTec é que a mesma possue índices de endividamento extremamente baixos. O baixo índice de alavancagem pode sim colocar algumas empresas em vantagem em um cenário de Bolha Imobiliária. Isto é fácil de explicar de uma forma bem simples. Empresas desalavancadas alocam seus próprios recursos na compra de terreno, construção e num cenário de bolha o tempo joga a seu favor e quando vende o faz com uma margem razoável.

    Estes players durante o período de formação de uma bolha são chamados de flippers. São na verdade os maiores ganhadores em uma Bolha Imobiliária. Os lucros passados por si só permitem o crescimento orgânico da empresa e o valor em risco do estouro da bolha acaba por ser apenas do capital empregado atualmente em novos projetos. Como não está alavancado e não tem dividas, não corre riscos de insolvência e liquidez, um dos maiores riscos do setor imobiliário.

    Observe também que a existência de uma ou outra empresa vencedora em um determinado setor não invalida a tese de haver uma bolha no mesmo.

    A sobrevivência e excelente performance de empresas como Amazon.com (suas ações valem hoje 125 vezes o que valiam em seu IPO em 1997), não invalidam a existência da bolha das empresas ".com" nos Estados Unidos em 2000.

    ResponderExcluir
  3. Otimo post... botamos uma versao menor, traduzida pro ingles aqui: http://brazilianbubble.com/next-on-the-brazilian-economy-the-burst-of-the-housing-bubble/

    ResponderExcluir
  4. Qualquer semelhanca, nao eh mera coincidencia...

    http://www.zerohedge.com/contributed/2013-07-26/housing-bust-20-here-courtesy-fed

    ResponderExcluir
  5. ESPECULAÇÃO SEM LIMITES É HISTORICAMENTE A COMPROVAÇÃO DE RECESSÃO EM QUALQUER SETOR NA ECONOMIA.

    ResponderExcluir
  6. Eu queria entender a relação entre as incorporadoras listadas na bolsa com o preço dos imóveis? É como falar que quando as ações da Petrobrás, OGX e outas petrolíferas caem o preço dos derivados de petróleo deveriam acompanhar a queda. Quais o fundamentos que você está usando para isso? Não vejo como o preço de uma ação tem alguma ligação com o preço de mercado do produto produzido pela empresa. Veja por exemplo os fabricantes de carros de luxo que quebraram e foram absorvidos por empresas de carros "normais", os preços dos carros de luxo caíram por isso? Falácia por falácia eu sou mais eu. Colocar dados reais e escrever bonito não quer dizer que sua retórica tenha fundamento. Maior lero lero isso ai.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Vamos por partes:

      1) "Eu queria entender a relação entre as incorporadoras listadas na bolsa com o preço dos imóveis?"

      Releia a análise. Veja o gráfico do mercado americano postado na análise.

      2) "É como falar que quando as ações da Petrobrás, OGX e outas petrolíferas caem o preço dos derivados de petróleo deveriam acompanhar a queda."

      É exatamente isso que ocorre com 90% das ações de petrolíferas no mundo inteiro. OGX é uma startup, não possui produção relevante e seu valor deriva muito mais de expectativa de produção futura a custos baixos do que diretamente ao preço atual do petróleo. Petrobras produz cerca de 2milhoes de barris e vende aproximadamente 2milhoes de barris de derivados no mercado interno a preço fixo, por isso não acompanha os preços de petróleo (como já fez no passado).

      3) "Quais o fundamentos que você está usando para isso?"

      Os fundamentos estão todos estabelecidos na análise.

      4) "Não vejo como o preço de uma ação tem alguma ligação com o preço de mercado do produto produzido pela empresa. Veja por exemplo os fabricantes de carros de luxo que quebraram e foram absorvidos por empresas de carros "normais", os preços dos carros de luxo caíram por isso?"

      Só um louco não vê que a elevação do preço do produto de venda de uma determinada cia é benéfico para a mesma! (desde que venda, é claro... o que me parece que não está acontecendo com as construtoras e incorporadoras pelo elevado nível de distratos e estoques)
      Montadoras de carro de luxo sofreram durante alguns anos com a elevação dos custos de produção que não conseguiam repassar para os preços. Como você bem deve ter observado na análise, este não foi o problema operacional das construtoras e incorporadoras brasileiras, pois o custo subiu muito menos que o preço de venda dos produtos.
      Como você gosta de exemplos, pegue o histórico de preços de Vale do Rio Doce e do Minério de Ferro e faça a correlação.

      4) "Falácia por falácia eu sou mais eu."

      Com certeza, este é o trabalho de vendedor. Eu não vendo nada, nem compro, portanto me atenho à análise econômica de forma isenta. Sem falar de "orelhada".

      Aliás, como vendedor, o preço não deveria ser tão relevante assim para vocês. Não deveriam se sentir ofendidos com estas análises, uma vez que com preços mais baixos provavelmente a velocidade de vendas voltaria a patamares mais elevados de anos anteriores.

      De qualquer forma, estou sempre aberto a análises independentes. Não tanto a lero lero...
      Se você puder me explicar porque as construtoras e incorporadoras tem apresentado performance tao ruim dado que o preço dos imóveis subiram mais de 300% e seus custos nem metade disso, me explique por favor.

      Por enquanto a única coisa que eu vejo é um estoque crescente, redução das vendas, aumento de distratos e falta de renda da população para o patamar de preços atuais.

      Excluir
    2. Flawless Victory. FATALITY!!!

      Excluir
  7. analise interessante, de um mercado repleto de assimetrias (e, portanto, repleto de oportunidades). Uma boa adição a essa analise seria compararmos os preços dos imóveis aqui (RJ e SP) contra a renda média dos trabalhadores nas mesmas regiões - e, para isso, creio, existe série histórica. Na sequência, comparamos esse mesmo indice com dados de paises como EUA, Chile, Espanha e outros. Claro, temos diferenças abissais não só em taxas de juros praticadas, como tbm em termos de disponibilidade do crédito: nos países citados, ele é não só mais barato, como mais longo, e mais farto.
    ótimo o ponto do "shadow banking", de fato a comparação crédito imobiliário / PIB, aqui no Brasil, é subestimada. Mas ainda assim creio que não se aproxima de vários outros paises (chile e Eua, citados). Isso me faz acreditar que sim, houve uma valorização rápida e extrema desses ativos aqui, mas talvez tenhamos espaço para mais crescimento, eventualmente com correções. Não o crescimento rápido que tivemos nos ultimos anos, mas ainda creio termos espaço. Um grande abraço

    ResponderExcluir
  8. Os custos de construção real descolaram dos índices que o medem no mercado (as construtoras contratam empreiteiras para cada etapa da obra, aí está uma das explicações), construção civil não possui economia de escala, é intensivo em mão de obra (em um cenário de aumento real dos salários, pelo menos nos anos anteriores), há de se levar em consideração tb a escassez de terrenos para construção (mais um aumento de custo), acredito que o setor não estava preparado para esse crescimento, não havia capacidade produtiva suficiente, por isso vários atrasos de obra, que atrasam repasses, etc, isso explica em parte os resultados ruins e as quedas nas ações das empresas.

    ResponderExcluir